A flor do entulho

quarta-feira, janeiro 14, 2004

ESPERA SÓ UM POUQUINHO...



Entraste na sua vida pela porta mais frágil no momento mais crítico que já atravessara. Tu, uma menina atinada, com utopias e ilusões que ninguém podia contrariar. Ele, um homem maduro e amargurado pelas descrenças e desilusões que carregava. Chegaste docemente, numa noite fria em que a tua doçura fez com que o seu mundo se revirasse. Contigo tudo parecia tornar-se natural e a ingenuidade dos teus olhos e a timidez do teu sorriso transformou por momentos o sofrimento e pacificou toda a desordem que envolvia a sua vida. Foram momentos de sedução indescritível em que os vossos corpos se fundiram apesar de teimosamente se mostrarem separados. As palavras fluíam e os sentimentos encontravam-se ao ponto de se transformarem numa só voz que gritava palavras num uníssono impressionante. Aparentemente tudo estaria controlado mas, dentro de cada um de vocês, um turbilhão de sentimentos impelia-os a agarrem-se eternamente e a permanecerem assim até que, movidos por uma força imaginária, se fundissem os dois e dessem origem a uma vida utopicamente radiante e fascinante que se tornaria indestrutível. Mas tudo não passou de um momento que terminou abruptamente num adeus formal. Sem saber porquê, tudo parecia ter acabado como tivera iniciado.
A partir daí as duas vidas entraram num sonho que se ia sustentando por uma pequena recordação esporádica onde se repetiam momentos. Tudo parecia ter terminado até ao dia em que a encontraste, imprevisivelmente, à entrada da casa que conhecias tão bem. Impressionou-te a intensidade com que te olhou e o sabor que tiveste ao contemplar o seu rosto risonho. “Boa tarde” foram as únicas palavras que disseram. Num tempo muito escasso tudo pareceu eternizar-se, tudo pareceu encontrar-se. Olhaste os seus olhos e permaneceste calado. Olhaste o seu sorriso e sentiste-te fulminado por uma atracção intensa. Foram instantes eternos onde os vossos mundos se uniram novamente. “Estou mesmo de saída. Adeus!” e tu quiseste dizer “espera…” mas permaneceste calado, “espera só um pouquinho...” mas viste-a sair, sorridente e eternamente bonita, mais bonita do que sempre estivera, “queria dizer-te uma coisa...” mas continuaste calado e a vê-la afastar-se para dentro de ti.
Nunca mais se encontraram mas permaneceram unidos e ainda hoje, ao passar por ti na rua, o teu rosto parece dizer “espera só um pouquinho”.



Benjamim Gil

3 Comments:

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    By Anonymous Anónimo, at 9:10 da manhã  

  • Gosto mt dos teus blogs, gosto da tua escrita, clara, fácil de compreender. Gosto deste texto, faz me lembrar um pouco os romances, mas numa versão curta e em k fica pendente a história.
    Para quando mais escrita? Anseio por algo novo. :)
    P.S.: Obrigada pelo comentário.

    By Blogger Mel, at 6:42 da tarde  

  • Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

    By Anonymous Anónimo, at 12:20 da tarde  

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